DESAPEGO – chave para liberdade

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DESAPEGO – chave para liberdade

A vida não está restrita às experiências manifestadas na matéria, no corpo físico, nem muito menos se resume a esta existência presente. O ser humano é um complexo conjunto de corpos com atuações em várias dimensões, desde a matéria até dimensões mais sutis.
Por enquanto procuremos entender que somos constituídos por pelo menos quatro corpos básicos: o mental, o emocional, o energético e o físico. Assim, não podemos nos contentar apenas com o que vivemos na matéria, apenas com as sensações dos cinco sentidos físicos.
Um outro pressuposto que devemos assimilar é o de que a vida na Terra é oportunidade de aprendizado e é uma etapa de fundamental importância para o nosso crescimento consciencial. Justamente por isso, a cada existência, trazemos uma programação a ser cumprida. E como toda programação, ela se desenvolve em um determinado tempo, com início e fim estabelecidos.
Partindo dessa possibilidade de que o tempo de nossa programação existencial terá um fim, reflitamos sobre o tema do desapego.
A palavra desapego conduz à ideia de soltar, deixar ir… mas também tem o sentido doloroso de renunciar e, consequentemente, perder.
“Toda a sensação de perda vem da falsa sensação de posse” (Budismo).
Para o Budismo, o significado da palavra desapego está relacionado à renúncia. Em português, renúncia conduz à equivocada ideia de ‘desistir de tudo e se isolar em uma caverna nos confins da Terra’. No Budismo, renunciar adquire o significado nobre de “determinação de ser livre” … daquilo que aprisiona os nossos egos.
O desapego é chave para os que buscam a iluminação.
Uma conhecida história zen conta que um Mestre e seu discípulo estavam a caminho de uma aldeia. Chegando a um caudaloso rio avistaram uma jovem com dificuldades para atravessá-lo.
O Mestre zen ofereceu-se para ajudá-la, pegou-a nos braços e atravessou com ela para a outra margem, seguindo depois cada um o seu caminho. O discípulo permaneceu todo o trajeto perturbado, pois havia aprendido que um monge nunca deve se aproximar de uma mulher, muito menos tocá-la. Assim, após muitas horas do ocorrido, não se conteve e questionou:

  • Mestre, o senhor ensina dia após dia a nunca tocar uma mulher e, apesar disso, o senhor pegou aquela bela moça nos braços e atravessou o rio com ela.
    O Mestre então respondeu:
  • Tolo, eu deixei a moça na outra margem do rio, mas você ainda a está carregando.
    Essa história ilustra como os nossos apegos nos atrapalham: o discípulo demonstrou apego aos princípios formais das suas práticas budistas e não viu, no gesto do seu Mestre, o verdadeiro objetivo daquela ação: ajudar ao próximo.
    Por outro lado, cuidado! Desapego também não é sinônimo de indiferença ou desinteresse.
    A importância do desapego reside no fato de estarmos conscientes da impermanência que caracteriza a vida na matéria, pois nada é permanente sobre a Terra: nem as coisas materiais, nem plantas e animais e nem as pessoas com as quais convivemos, por mais que cuidemos bem delas!
    A vida na Terra tem por natureza a transitoriedade, ou seja: é passageira, efêmera.
    Você está consciente disso?
    Você já parou para pensar em quantas roupas, livros, objetos estão entulhando seus armários e já de há muito não lhe são mais úteis?
    Você já se deu conta de quais e quantos dos seus relacionamentos não lhe são mais agradáveis e estão sendo mantidos por você a ‘ferro e fogo’, apenas por comodismo, por insegurança, por conveniência ou mesmo por orgulho?
    Já parou para pensar que o trabalho que você faz hoje lhe causa mais estresse do que lhe proporciona segurança financeira? Você ainda tem dúvidas sobre se aposentar, muito embora já tenha completado o tempo de serviço exigido?
    Esses são exemplos de apegos a situações, a pessoas, ao dinheiro.
    Pense consigo mesmo: a que ou a quem estou me apegando com todas as minhas forças neste momento?
    E em seguida, pense: do que ou de qual relacionamento posso abrir mão neste momento? O que ou a quem devo ‘deixar ir…’?
    O desapego é a chave para aceitarmos a impermanência da vida matérial!. Apego é bagulho energético, entulho que impede a evolução e o pleno desenvolvimento da nossa programação existencial.
    Se você não se identificou com nenhum dos exemplos anteriores ou não identificou qualquer apego, você está indo bem até aqui!
    Agora pare mais uma vez para pensar e responda para você mesmo: como encarei a dessoma (termo que aqui utilizamos para morte) do meu pai, da minha mãe, do meu filho, do meu cachorrinho?
    Tive discernimento suficiente, apesar de toda a dor que senti e ainda sinto, para entender que a morte faz parte dessa vida que é passageira?
    Que a dessoma é fenômeno tão natural quanto nascer e crescer?
    Não aceitar a morte dos entes queridos como acontecimento natural é também apego: apego à pessoa que se foi, apego às crenças e tradições e valores sociais que criam frases como: ‘nenhum pai deveria enterrar seu filho’ ou ‘a maior dor de uma mãe é a perda de um filho’… e que só reafirmam a total falta de consciência de que a vida continua!
    Evidentemente que não estamos dizendo que desapegar é cultivar a indiferença para com as pessoas, de modo tal que quando elas dessomarem nós não sofreremos! A separação é sempre dolorosa porque há amor, mas também há apego…
    Mais uma coisa para você refletir: você tem apego à sua vida? Se você soubesse que sua proéxis chegou ao fim, você partiria para outra dimensão com tranqüilidade?
    Perceba que estamos perguntando ‘com tranquilidade’. E por que?
    Porque o apego não oferece tranqüilidade, mas sofrimento e até desespero, diante da perda do objeto ou da pessoa a quem nos devotamos cegamente.
    Praticar o desapego é tornar-se paulatina mas firmemente consciente, a cada dia, de que tudo nesta vida intrafísica é mutável, como afirmou o filósofo Heráclito, na Grécia antiga ao pronunciar a famosa frase: “panta-rei”, traduzida como ‘tudo muda, tudo flui, nada persiste!’.
    Esta é uma explicação curta, simples, da transitoriedade da vida. Não há nada eterno na vida humana; inclusive as coisas negativas ou que não atendem aos nossos interesses, em geral muito egoístas ainda.
    Soma (corpo físico) é transitoriedade.
    A existência intrafísica é mera projeção energética mais prolongada, porém sempre efêmera, da consciência extrafísica.
    Tanto no renascimento humano e seu restringimento consciencial (rigoroso e inevitável), quanto na desativação somática e sua libertação temporária no período intermissivo – período entre uma dessoma e uma ressoma -, os fatos não alteram a natureza essencial e característica dos seus pensenes (pensamentos, sentimentos e emoções).
    Reconhecimento, sucesso, ganhos financeiros, beleza física. Nada disso nos satisfaz sem amor. Pratique dar e receber o maior dos presentes, e você vai ter tudo o que realmente importa!
    Por ser a vida mutável, todas as coisas e todas as condições são mutáveis. Por isso, deixe ir as coisas, os abusos, a raiva, a censura… mas também os momentos felizes, as comemorações festivas e alegres… Deixe que venham e que se vão.
    Tudo o que fazemos, devemos fazer com sinceridade, com honestidade e com todas as nossas forças para que seja feito da melhor forma possível.
    Porém, uma vez feito, feito está! Não nos apeguemos. Não importa o esforço feito ou a beleza do produto final… tudo passa.
    Os monges budistas costumam fazer esculturas de sal colorido que são desmanchadas tão logo ficam prontas exatamente para representar a transitoriedade da vida.
    Buda afirmou: a busca da felicidade ‘é viver no mundo mas NÃO PERTENCER a esse mundo’. Por mais difícil que seja, devemos sempre estar prontos para o reinício, para começar de novo!
    As coisas têm o valor que damos a elas. A lei da morte, segundo o Dalai Lama, consiste em não haver permanência entre todas as criaturas vivas ou materiais existentes no Planeta Terra. Ninguém vive sem estar exposto às perdas.
    Esta constatação não elimina o inevitável sofrimento que deriva de uma perda, seja ela qual for, grande ou pequena. No entanto, se estamos consciente de que tudo é passageiro, o nosso sofrimento não se deixa impregnar por emoções de revolta ou de desesperança.
    Embora a dor e o sofrimento sejam fenômenos humanos universais, isso não quer dizer que seja fácil aceitá-los quando nos acomete.
    No entanto, o que ajuda a enfrentar esses momentos é ter consciência de que tanto os esses momentos de dor quanto os de alegria efusiva são efêmeros e logo passarão. Especificamente nos casos de dessoma, urge entender que a duração do tempo passado na Terra é uma ilusão, pois se trata de uma limitação do corpo físico e do mundo físico.
    Um médium americano afirma que no processo de cura de si mesmo, uma pessoa tem que ter dois ingredientes fundamentais: (i) a compreensão espiritual conquistada através do processo constante do autoconhecimento; (ii) e a prática persistente do desapego.
    Outro filósofo grego, Epitecto, que nasceu escravo, desenvolveu uma filosofia de vida segundo a qual é preciso procurar compreender o sentido de nossas dores e medos e só então libertar-nos da sua influência, através de treinamento permanente. Segundo ele, são as provações/dificuldades que revelam de que forças somos dotados para enfrentar cada problema.
    “Veja as coisas como elas são e preserve-se assim da dor causada pelos falsos apegos e os estragos evitáveis (…) As coisas são simplesmente o que são. (…) Em qualquer acontecimento, por mais terrível que pareça ser, não há nada que nos impeça de procurar uma oportunidade oculta de aprendizagem, o que requer uma grande dose de coragem” (Epitecto).
    Assim também é com relação aos nossos apegos. É preciso coragem, primeiro para reconhecer ao que ou a quem estamos apegados a ponto de termos criado não uma relação de amor, como é comum definirmos tal situação, mas uma relação de dependência.
    O Budismo adverte: “tudo quanto teve princípio, terá fim”. Isso define, é claro, a natureza própria de tudo o que é matéria.
    Há também uma frase bastante repetida cujo significado, em essência, é justamente a efemeridade de tudo o que vivemos na matéria, quer sejam alegrias quer sejam atribulações e dores:
    “Não há bem que nunca acabe e nem mal que sempre dure”.
    E para encerrarmos, fiquemos com a seguinte recomendação:
    “Medita profundamente na instabilidade das coisas humanas e na inconstância da vida terrena”.
    Esse é um exercício diário para todos nós… Comece hoje!
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Colaboradora e pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas Biofísicas (CEPP), com formação acadêmica em Comunicação Social e em Filosofia, ambas pela Universidade Federal da Paraíba.

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