VAIDADE INTELECTUAL E O MEDO DE NÃO SABER
Estamos mais acostumados a pensar na vaidade do ponto de vista físico, relacionada ao investimento na aparência física. Mas existe a vaidade, como podemos verificar no dicionário, que nos remete a outro tipo de “aparência ilusória”. Que seria atribuir a si características intelectuais, baseado no desejo ou na necessidade de reconhecimento e de admiração por parte de pessoas que consideramos importantes e com “poder” de validar nossa existência.
Claro que isso envolve uma série de percepções e estratégias. E nossa sociedade é muito boa nisso. Criamos regras para nós e para os outros, definindo qual conhecimento é importante; como deve ser buscado e aferido; quem é digno de ser ouvido, lido, referendado; criamos instituições que ditam as regras, e atribuímos autoridade a quem se submete a elas.
Mas não duvidemos que mesmo com todas essas estratégias de validação, ainda seja impossível nos livrarmos da sensação humilhante de que não sabemos de tudo e que há sempre alguém que sabe mais do que nós. Ainda seguimos com essa ferida nos nossos egos, por mais livros que tenhamos lido e por mais cursos e títulos que tenhamos acumulado.
Essa deveria ser a nossa “deixa” para questionarmos sobre esse traço e os valores que o acompanham. Será que se estivéssemos mais atentos ao que significa aprendizagem, enquanto processo de busca contínua, que envolve erros e acertos, teoria e prática, nos tornaríamos menos vítimas desse tipo de ilusão, desse medo de não saber?
Do ponto de vista evolutivo, não deveríamos ter medo de não saber. Considerando que ainda somos seres em construção, este medo é totalmente infundado. Ao contrário, é a partir dessa percepção e vivência, que podemos nos manter abertos ao que ainda não sabemos, ao que estar por vir no que se refere à nossa evolução.
No artigo de Victor Almeida Moreira – “Você já construiu sua antibiblioteca?”, ele relata que Nassim Nicholas Taleb, em seu livro “A Lógica do Cisne Negro”, conta que o escritor Umberto Eco possuía uma grande biblioteca com mais de trinta mil livros, porém, nem todos lidos. E a maioria das pessoas que o visitava costumava perguntar quantos daqueles livros ele já tinha lido. Neste ponto, Taleb argumenta, que é o tipo de pergunta que leva a uma forma equivocada de enxergar o conhecimento. Pois são os livros não lidos que deveriam ser considerados mais valiosos do que os que foram lidos.
Victor Almeida acrescenta que os livros que você ainda não leu (e não há como ler todos), podem ser vistos como a evidência de tudo que você não sabe. E apesar de isso parecer ameaçador, para alguns, “expõe o quanto seu saber é ínfimo diante da imensidão de leituras que você ainda não fez. Desnuda a pequenez de seu conhecimento, despertando-lhe a real consciência do quanto você ainda não sabe, do quanto há para aprender e melhorar. E nunca é tarde para aprender!”
Se quisermos crescer, nos tornarmos pessoas melhores, precisamos nos aprofundar cada vez mais no que não conhecemos. Ao invés de estarmos perdendo tempo nos gabando das informações acumuladas ou buscando aparentar um profundo conhecimento, que na verdade ainda está longe de ser universal, parece mais útil nos atermos à aplicação e avaliação dos conhecimentos, e a busca do que ainda precisamos aprender. Com este abertismo, não gastaremos tanto tempo e terapia, lambendo nossas feridas (egóicas), e com certeza, recuperaremos o prazer de aprender, inerente ao desenvolvimento humano. Não mais estaremos presos na armadilha da vaidade intelectual, que ainda pode estar lá, mas já seremos capazes de melhor gerenciá-la.
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